segunda-feira, 21 de julho de 2014
sábado, 11 de janeiro de 2014
Busca das hipóteses de Rosenfeld no filme “Mais Estranho que a Ficção”
Olá pessoal, segue breves explicações que fizemos em algumas aulas e eu achei interessante, muito interessante. Lembre-se nunca pegue nada da internet sem referenciar. Boa leitura!
Busca
das hipóteses de Rosenfeld no filme “Mais Estranho que a Ficção”
Letícia Cristina
Maioli
Letícia Maria de
Godoy
Letras Inglês
Anatol Rosenfeld, no
ensaio Reflexões sobre o romance moderno,
faz uma discussão sobre o romance moderno e propõe ao leitor uma série de
reflexões baseadas em hipóteses de extrema importância para a caracterização e
compreensão do gênero. E, para que haja um melhor esclarecimento das ideias,
analisaremos, superficialmente, o filme Mais
estranho que a ficção, lançado em 2006, escrito por Zach Helm e dirigido
por Marc Forster.
A saber, as hipóteses levantadas
pelo autor são ideias como a existência de um “zeitgéist”, ou seja, um espírito
unificador de época que influencia as produções artísticas em cada período da
história; a desrealização, ou seja, o não compromisso com a realidade, o
rompimento com a mimese do real, o que engloba aspectos como o tempo, o espaço,
o personagem e o fluxo de consciência que é a tentativa de representar o que se
passa dentro da mente humana.
Vamos então, analisar cada uma destas hipóteses com
exemplos do filme em questão, neste o protagonista Harold Crick, sofre um
processo de “maquinização” devido as transformação provocadas pelo capitalismo,
o que podemos apontar como o zeitgéist da sociedade da Era 2000. Apesar de ser
um homem bem-sucedido, vive exclusivamente em função do tempo, todos os minutos
são contados para que possa aproveitá-los ao máximo e sua rotina é exatamente
idêntica todos os dias, desde o momento em que escova os dentes, amarra a
gravata, toma o ônibus e assim por diante, não tendo tempo nem para pensar.
Tratando-se
da “desrealização”, as obras deixaram de ser mimética, de representar a
realidade. Depois de muitos anos vivendo uma vida insignificante (o que se
enquadra também em outra hipótese do mesmo autor), Harold começa a ouvir uma
voz feminina que “narra” todas as suas ações, como se fosse uma suposta autora
de sua “história”. Este fato mostra que não existe um compromisso com a
realidade, pois pensamos que a narradora está introduzindo o protagonista do
“longa”, até ele ficar completamente assustado em escutar a voz dessa
narradora. Percebemos então que, assim como nós, Harold escuta essa pessoa que
narra sua vida e no começo pensa estar ficando louco. Algo completamente
provável na mente de uma pessoa que sofre de esquizofrenia. Mas não é o que
acontece.
Descobrimos no decorrer
do filme que a narradora é uma escritora chamada Karen Eiffel, conhecida por
“matar” todos os seus protagonistas. Ela está escrevendo a “vida” de Harold e
por conta de prazos na editora, precisa, urgentemente, matá-lo e encontrar um
brilhante fim para o romance. Para tanto, até mesmo contrata a ajuda de uma
assistente que tem a missão de livrá-la do bloqueio criativo. Percebemos o fato
claramente quando Harold, em uma cena, preocupado com o tempo como sempre, está
no ponto de ônibus e percebe que seu relógio parou. Ele pergunta as horas para
uma pessoa que está ao seu lado, ajusta seu relógio e escuta novamente a voz da
narradora que diz algo como “mal sabia ele da sua morte iminente.” Diante desta
frase Harold fica completamente descontrolado, começando a gritar para o alto e
perguntar os motivos de sua morte. Mas, percebemos então, que Karen não o ouve,
o que gera uma situação nada mimética, pois Harold começa a ter consciência de
que é uma criação.
De
acordo com Rosenfeld, outra modificação essencial foi a “eliminação” ou “ilusão
do espaço”. No filme, sabemos onde Harold está e o que está fazendo em cada
local mostrado, mas há uma ruptura neste espaço ficcional com o suposto real
quando ele liga para Karen enquanto ela está escrevendo exatamente sobre essa
sua ação. Depois eles se encontram, o que gera uma situação bastante
sobrenatural, pois o que era apenas uma ficção para Karen acaba se
materializando exatamente a sua frente, rompendo com as barreiras entre ficção
e realidade.
É
possível notar também, uma descontinuidade temporal, como afirma Rosenfeld “os
relógios foram destruídos” (p. 80), A representação passa a ser dada de forma
subjetiva, pois o homem “não vive no tempo, ele se torna o tempo”. Harold vive
o presente, mas a todo o momento, o passado permanece inserido nele, visto que,
seus dias são exatamente iguais aos anteriores. E, além disso, através da
narradora, conhece seu futuro, inclusive que sua morte está próxima.
O
autor afirma que todas estas transformações foram decorrentes de um único
desejo: o de representar, fielmente, as experiências psíquicas tão como são e
não como deviriam ser. Por isso podemos identificar também o uso do fluxo de
consciência no filme, pois o protagonista se vê obrigado a tomar uma
providência para não morrer e assim
sua mente entra em fortes conflitos, perde-se a imagem de um personagem
formado, delineado, real. Harold Crick oscila entre o mundo “real” e ficcional
desfazendo a ideia da verossimilhança.
Outro fator que pode
ser observado superficialmente é o behaviorismo. Harold Crick é um personagem
cuja existência é insignificante. Ele não se sobressai dos demais, nem tem uma
existência que se destaque no mundo. Ele simplesmente existe. Sua rotina é
exatamente igual, ele não tem uma vida social e nem sequer pensa em tê-la. Seu
trabalho é sua vida. Vive prezo ao relógio para nunca se atrasar, de modo que
possa fazer as mesmas coisas nos mesmos horários. É um “Falso eu” que, como
Rosenfeld postula, são seres humanos que “tendem a tornarem-se objetos sem alma
entre objetos sem alma. Entes “estrangeiros”, solitários, sem comunicação.” (p.94)
Percebe-se que Harold vai perdendo um pouco desta característica behaviorista
quando, ao descobrir sobre sua morte iminente, ele começa a aproveitar a vida
da melhor maneira possível, começando a tocar guitarra, a faltar ao serviço
para se divertir, e mesmo sair com uma garota, coisas que antes nem cogitava em
fazer. Então, ao saber que iria morrer, passa a perceber o “sentido” do eu,
buscando novos caminhos para serem trilhados antes que tudo acabasse.
Portanto, após a
análise que fizemos, consideramos as hipóteses levantadas por Rosenfeld
relevantes para o estudo do romance moderno, pois as encontramos em várias
outras obras modernas e também no filme Mais
Estranho que a Ficção.
Referências
ROSENFELD, Anatol.
Reflexões sobre o romance moderno. In:____. Texto e contexto I. São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 75-97.
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